Capítulo 3.
Bethânia
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Passei entre as pessoas e pelo que percebi ninguém olhou para mim. “Melhor assim!”, pensei. O bom de ser o primeiro dia é que não preciso me preocupar em ser a novidade da escola. Subi as escadas com a cabeça um pouco baixa, entrei pela porta dupla do lado direito da entrada leste da escola.
— É assim que você quer entrar pela primeira vez no lugar onde você vai viver os próximos quatro anos da sua vida?” — alertou, minha consciência.
No fundo, no fundo é verdade! Eu não posso andar de cabeça baixa nos próximos quatro anos da minha vida. Já que estou aqui, vamos aproveitar! Não é exatamente o que planejei, mas é o que estou vivendo, então, é melhor aproveitar ao máximo.
Ergui a cabeça e comecei a subir a pequena escada, que dava acesso ao primeiro andar e fui em direção ao escritório da minha coordenadora no colegial. Ela está com o meu cronograma de aulas, e eu preciso saber onde é a minha primeira sala. Eu a conheci quando vim com minha mãe há duas semanas para fazer a transferência de escola. Ela parece ser bem simpática, o que é perfeito, porque ela que tomará conta dos meus assuntos escolares nos próximos quatro anos.
“Bem melhor andar assim, de cabeça erguida!”, pensei ao avistar a sala da Senhora Kim, minha coordenadora. É, a Bê corajosa manda bem, de vez enquanto! Ela só tem me irritado ultimamente por tentar forçar um sentimento pelo John que não existe mais.
— Oi, Senhora Kim! — falei ao mostrar a cabeça no lado esquerdo da porta. Eu queria ter sido mais educada e bater na porta, mas a porta estava escancarada.
— Olá, Bethânia! — ela me respondeu com um sorriso enorme no rosto e com um batom super vermelho, que de longe dava pra ver.
— Espere dois minutos! Eu já estou terminando com o Roberto e já te chamo. — eu fiquei vermelha de vergonha ao perceber que ela estava ajudando um aluno. Com certeza, eles perceberam, pois as minhas bochechas são mestre em me entregar quando eu fico com vergonha de algo.
— Tudo bem, Senhora Kim! E desculpe-me por interromper. — meu rosto esquentou de tanta vergonha.
Ela me olhou com um sorriso e uma expressão de: “Não se preocupe.”
Encostei-me à parede da sala um pouco distante da porta, porque a última coisa que eu queria era que alguém pensasse que eu estava perto da porta para bisbilhotar a conversa. Os alunos passavam pelo corredor, conversando na maior alegria, contando as novidades das férias de verão. Senti um nó na minha garganta ao imaginar que estaria vivendo algo parecido se estivesse em Nova York.
“Ai que saudades dos meus amigos!” , pensei ao suspirar e passar a mão nos meus cabelos.
— Bethânia? — a voz da Senhora Kim surgiu no meio do barulho das vozes dos alunos que estavam no corredor.
Passei pelo Roberto, que se me recordo bem é o nome do menino que ela estava ajudando. Ele me olhou e um leve sorriso surgiu em seus lábios. No mesmo instante senti o meu rosto esquentar e com certeza ficar bem rosado. E devolvi pra ele um sorriso bem leve ao entrar na sala da senhora Kim.
— E ai, Bethânia? Como estão sendo os seus primeiros minutos na nova escola?
— Acabei de chegar, Senhora Kim. O primeiro lugar que explorei foi a sua sala. — falei com um sorriso sem graça ao admirar a beleza da Senhora Kim. Ela tinha a aparência de ter uns trinta e poucos anos. Uma negra lindíssima com lábios carnudos e vermelhos. Um sorriso radiante e os dentes com um tom de branco de dar inveja. Realmente ela era de tirar o fôlego.
Com uma gargalhada, ela chamou a minha atenção, enquanto eu estava perdida em meus pensamentos…
— Bem, aqui não tem muito a ser explorado. Só um monte de arquivos dos meus alunos favoritos.
Eu fiquei toda sem graça e mais uma vez o tom rosado avermelhado deu o ar da graça no meu rosto, e tinha certeza, pois eu sentia o meu rosto esquentar toda vez que isso acontecia. “Meu Deus, será que vai ser assim o dia inteiro?”, pensei ao apertar levemente os meus dedos.
— Bem aqui está o seu cronograma de aulas. Coloquei Educação Física, no último período. Mas, e aí? Você já decidiu se vai participar do time de Maratona? Eu acho que vai ser excelente para você se enturmar com alguns alunos. Se você quiser eu converso com a treinadora e você já poderá ir à reunião de hoje.
— Obrigada pelo cronograma, e sim, você pode falar com a treinadora. Eu quero participar do time! — respondi com um leve sorriso em meu rosto.
— Tudo bem, então. — e pegando um papel quadrado com a letra K de Kim ela escreveu uma informação e me entregou.
— Este é o número da sala que eles vão ter a reunião no final do dia.
— Obrigada, Senhora Kim. Agora vou tentar descobrir onde é o meu armário para guardar os meus livros.
— No segundo andar, viu! — ela falou um pouco mais alto, pois eu já estava saindo pela porta. Virei e dei um sorriso, para ela ver que eu tinha ouvido.
Comecei a caminhar pelo corredor e me arrependi de não ter vindo para o dia de iniciação dos alunos do primeiro ano.
“250”, pensei, por ser duzentos explica o fato de ser no segundo andar. Esta escola é tão grande que nem sei se vai dar tempo para eu tomar café. “Minha mãe vai me pegar”, pensei com um sorriso nos lábios e balancei a cabeça só de pensar no que ela me diria sobre isso.
Finalmente, cheguei no segundo andar, e logo, enxerguei o armário 230. Ainda bem, pelo menos não estou tão longe assim. O meu armário estaria à minha direita, então, virei e ao caminhar um pouco, logo, dei de cara com o meu armário e com um garoto que só de costas me chamou a atenção. Ele estava usando uma camisa de lista horizontal de cor branca e cinza. Seus cabelos brilhavam como ouro de tão loiro, ele estava usando uma calça Jeans escura.
— “Bonjour!!! Você ainda tem que tomar café! Não é hora de ficar olhando para os meninos da escola, pressa nessas pernas meu amor!”
Pronto, agora meu subconsciente me chama atenção em outra língua. Era só o que me faltava! Ele está cursando Francês junto comigo, como esquecer.
“Meu Deus! O café!” , desesperei ao cair a ficha do que a minha brilhante mente tentava me alertar! Eu tenho certeza que minha mãe vai me perguntar o que eu achei do café da manhã da escola, eu jamais mentiria para ela. Voltei a caminhar em direção ao meu armário, mas viajei mais uma vez no garoto.
“Bem o tipo da Rita, eu tenho certeza que ela se apaixonaria . Loiro, alto e com os braços bem definidos”, pensei com um leve sorriso ao imaginar a reação da Rita.
— Apaixonar pelo quê? Você nem viu o rosto do menino e já está falando em apaixonar!
Eu comecei a rir de mim mesmo, até parece que minha mãe implantou uma Bethânia implicante dentro da minha mente. Que pensa exatamente como ela deseja que eu pense. Sem olhar para o lado, rindo ainda comecei a ler o código do meu armário.
— Não é uma boa ideia! — uma voz interrompeu a minha tentativa de abrir o armário.
Meu Deus, o menino falou comigo. E agora? O calor no meu rosto foi instantâneo. “Ai que vergonha. Fiquei vermelha de tudo, tenho certeza, como vou encarar esta situação agora?!”
Olhei para cima através dos meus cílios e quase cai. E não é que o menino é lindo! Tipo aqueles deuses gregos que a gente vê em filme. Eu simplesmente frisei, perdi a voz e não tinha onde esconder a minha cara. E com certeza, a Bê crítica também se escondeu atrás de algum neurônio, porque não é possível que alguém não fique impressionada diante de tanta beleza. Eu acho que naquele momento eu esqueci de respirar.
“Meu Deus! Meu Deus!”, indaguei para ver se minha mente voltava a funcionar normal.
— Tudo bem? Você precisa de ajuda? Eu sou o Mark. — ele perguntou com um sorriso que deveria ser proibido para não causar danos por aí. Totalmente apaixonante!
— Abre a boca, fala alguma coisa, o menino vai achar que você é muda! — a brilhante voz da minha consciência resolveu sair do esconderijo e dar o ar da sua bruta sinceridade, ela não está pegando leve hoje.
— O…O…Oi. — foi o máximo que consegui tirar do nó que estava na minha garganta.
— Você é nova por aqui, não é? — ele perguntou.
— Sim, eu morava em Nova York e me mudei pra Nova Jersey há três semanas.
Respondi, e minha voz ainda estava muito trêmula. Dava até pena de ver a minha reação! Meu Deus, o que está acontecendo comigo? Fiquei besta, de uma hora para outra, esqueci até como falar e responder perguntas bobas. Levantei a minha cabeça em uma tentativa de me apresentar mais forte e educada e me deparei com os seus olhos. Que olhos!!! Verde claro, redondos e brilhantes! Se a Rita estivesse aqui, ela cairia de amor!
— Que legal, eu amo ir à Nova York! Morei lá por anos. Meu pai ainda trabalha por lá e sempre nos convida para acompanhá-lo em algum evento ou jantar. Ainda temos o nosso apartamento lá. — ele deu um sorriso e seus olhos brilharam diante da lembrança que provavelmente passou pela sua mente.
"Gente, que sorriso. Para o ônibus que eu quero descer! Eu não vou dar conta de conversar com esse menino sem dar vexame."
— Mas, então, você precisa de ajuda ou não? E outra, eu já até te falei sobre a minha família e você não me deu a honra do seu nome.
Ele falou ao fechar a porta do armário e encostar no armário com os braços fechados como se estivesse esperando uma resposta.
— Bethânia, meu nome é Bethânia. E sim eu preciso saber onde é a sala de História Mundial, que é a minha primeira aula. Sala de número 120.
“Ufa, até que emfim soltei uma frase completa!”
— Ah, mas então te ajudar vai ser mais fácil do que eu pensei. Eu tive essa matéria no ano passado, com a Senhora Joana.
— Sério? Eu também peguei a Senhora Joana. Eu só vou guardar este caderno extra aqui no meu armário, e se você não se importar vai me ajudar muito mesmo. — sorri e com certeza o meu rosto deveria estar roxo, porque vermelho já não era mais uma opção de tanta vergonha que eu estava. Que cara de pau a minha de aceitar a ajuda, eu deveria ter falado que estava tudo bem e que eu não precisava de ajuda nenhuma.
— “Cara de pau!? Sinceridade, isso sim. Porque você está mais perdida que bala em filme de Bang Bang.” — Aff, eu e minha luta com a minha Bethânia interior, sempre corajosa e desinibida demais para meu gosto. Porém, no fundo é verdade, eu realmente estou precisando de ajuda.
— Pronto, podemos ir. — falei ao fechar a porta do meu armário e soltar aquele sorriso de quinta de tanta vergonha.
— É, realmente não foi muito inteligente de sua parte me dar a sua senha do armário.
Ele falou ao dar uma gargalhada e caminhar em direção ao corredor de onde eu vim. Eu o seguia sem questionar, aliás ele era o conhecedor dos labirintos desta enorme escola.
— Mas, eu não te dei nada não! Eu só tenho um pequeno problema de pensar alto, às vezes. E eu tenho certeza, que até o oitavo período você já esqueceu a minha senha. — falei sorrindo e me estranhei, pois estava ficando um pouco mais confortável. Talvez pelo fato de não estar olhando diretamente para ele e sim caminhando lado a lado, enfrentando a multidão de alunos que pareciam estar correndo contra o tempo.
— Bom, eu acho isso quase impossível.
Ele falou com um ar de orgulho e graça ao mesmo tempo.
— Como assim impossível? — parei e coloquei a mão na minha cintura exigindo uma resposta.
— Calma, a culpa não é sua! E sim do Vitor, que vivia pedindo para eu pegar os livros dele no armário. — ao me responder ele parou e virou em minha direção, o suficiente para meu coração disparar e o meu fôlego pedir socorro de novo. O que é isso?! Eu nunca senti isso por garoto nenhum. Estou há vinte minutos nesta escola e já me sinto intimidada por alguém, isto simplesmente não é bom! Ainda mais que esse alguém é um menino, aff!
Com o rosto pegando fogo de vergonha de ser encarada por aquela piscina verde, que são os olhos do Mark, dei um sorriso sem graça e respondi:
— Vitor, sei, sei!
— Tô falando sério, o Vitor estava no último ano e como eu era o novato do time avançado de Futebol Americano, ele vivia me pedindo favores. Por isso, eu sei a sua senha do armário, porque ele era meu vizinho de armário e vivia me pedindo para pegar ou guardar os livros para ele. — ele balançou a cabeça como se achasse engraçado a minha preocupação com uma senha de armário escolar e continuou a andar.
Caminhamos uns trinta segundos sem falar nada, e eu estava quase tendo um ataque de coração. Dentro de mim parecia que tinha uma banda de rock tocando, meu coração estava disparado! Mil coisas passavam pela minha cabeça, mas a principal de todas era o que as meninas iam pensar disso tudo! De uma hora para outra senti meu braço ser puxado e de repente o meu rosto estava imprensado entre o peitoral do Mark e seu braço, que me abraçava levemente. Meu Deus! Pareceu uma eternidade e os meus sentidos gravaram tudo o que se passou em breves segundos. O seu delicioso perfume impregnou as minhas narinas e de repente eu estava tonta e bamba das pernas, não sei se por causa do susto ou pela multidão de sentimentos que surgiram dentro de mim só de encostar o meu rosto nele. De repente, o Mark colocou a mão nos meus ombros e me puxou levemente diante dele com um sorriso enorme balançando a cabeça.
— Você está querendo ir para enfermaria antes mesmo de ir ao primeiro horário é? Poxa, dá pelo menos um tempo para se acostumar com a escola antes de desistir! O pessoal aqui é legal, eu prometo. — o tom sarcástico brincalhão dele me fez soltar um leve sorriso.
— O que foi que eu fiz? — perguntei e percebi que minha cabeça girava ao tentar me concentrar. Eu estava tonta, era só o que me faltava. Aff!
— Você não viu a porta do armário aberta não é? — os seus olhos se arregalaram e um sorriso tomou conta de todo o seu rosto ao apontar para a porta do armário da ponta que estava aberta. Ele devia estar é bobo com a minha falta de atenção.
— Não! — eu respondi meio irritada comigo mesma. Como é que eu não vi a porta na minha frente! Realmente a minha cabeça não está funcionando direito hoje. Ele soltou os meus ombros e as minhas pernas bambearam e eu tive que me apoiar nele para não cair.
— Bethânia?! Tudo bem com você? — Mark me segurou novamente com um olhar assustado.
— Acho que sim. — respondi ao recuperar um pouco de força em minhas pernas, já tendo um pouco de segurança para ficar de pé sem me apoiar nele.
— Obrigada, Mark, eu realmente não vi a porta e acho que o susto de ser puxada de repente fez a minha pressão baixar um pouco, mas já estou bem melhor — com um leve sorriso dei uma piscadinha para ele.
Ele balançou a cabeça com um sorriso.
Meu Deus, onde eu encontrei coragem para piscar para ele, eu estou ficando doida. Realmente eu não sei o que está acontecendo hoje.
— Que bom, então! A sua pressão é fácil subir! Você comeu alguma coisa hoje?
— Não. — respondi para ele com um sorriso sem graça.
— Com certeza é falta de sal no seu sistema e a temperatura neste corredor cheio de gente também não está ajudando. Parece que o sistema de ar condicionado não esta dando conta da correria do pessoal no primeiro dia. — ele disse ao olhar para o ar condicionado.
— Só um minuto! Que idade tem esse menino para saber de pressão baixa! — A minha amiga íntima tem razão, meninos na idade dele geralmente só têm conhecimento na área de esporte e algumas coisinhas extras.
Com certeza não consegui esconder o leve sorriso e a frisada na testa que dou quando estou pensando sarcasticamente, pois o Mark interrompeu o meu passeio no trem do pensamento que a “Bethânia esperta” estava conduzindo!
— O que foi? — ele perguntou frisando a testa também.
— Nada demais, só achei engraçado você me perguntar se eu tinha comido algo, por causa da pressão baixa.
— Ah, mas disso eu entendo muito bem. Foram anos correndo na cozinha para pegar sal entre outros alimentos para ajudar minha mãe. Ela tem a pressão baixa também. Ainda mais quando temos um calor de quase quarenta graus como hoje. Você precisa tomar bastante água e se alimentar bem. — ele pegou no meu braço e continuamos a nossa jornada.
Realmente, não sei o que esperar desse menino. Cada uma que me aparece! Balancei a cabeça e comecei a observar que por onde passávamos os meninos o cumprimentavam e as meninas davam um sorrisinho sem graça, quero dizer, pelo menos era sem graça para mim. Ao descermos a escada era um “bate aqui, mano!” daqui, “toca aqui maluco!” dali, e “esse ano a taça é nossa!” de vez em quando. Aff, meninos e suas manias!
Viramos a esquerda no final de escada e eu pensei: “Ah, um lugar familiar. Ali é a sala da Senhora Kim.” Passamos pela sala dela e paramos na última sala do corredor a direita.
— Pronto! Aqui é a sua sala de História Mundial. Eu queria poder levar você em todas as outras, mas tenho que ir para uma reunião rápida do time de futebol americano antes da primeira aula, e essa reunião eu não posso faltar. Nos vemos por aí, então?
Ai! Ele deu aquele sorriso de novo! Por favor, Bê, não faz feio!
— S…sim, nos vemos. M...mais uma vez obrigada pela ajuda! — dei um sorriso sem graça, pois meio que dei uma gaguejada na hora de falar. Abaixei a cabeça para ver se escondia o vermelhão no meu rosto que parecia que ia pegar fogo de tanta vergonha.
Ele pegou no meu queixo e ergueu a minha cabeça até que os meus olhos estivessem fitados no dele.
— Foi muito bom te conhecer. Você é muito bacana. E vê se cuida dessa pressão baixa, viu? — com um olhar de matar qualquer esperança de me manter forte, ele ajeitou uma mecha da minha franja que estava caindo no meu olho e foi embora.
Eu fiquei ali sem reação nenhuma, nem tchau eu falei para ele. Encostei na parede, e fiquei um pouco sem ar por alguns segundos.